Algum tempo depois, num dia de festa religiosa, foi preparado um grande banquete na casa de Tobit.
Ele disse então ao seu filho: Vai buscar alguns homens piedosos de nossa tribo, para comerem conosco.
Ele saiu, mas logo voltou, anunciando ao pai que um dos filhos de Israel jazia degolado na praça. Tobit levantou-se imediatamente da mesa, sem nada haver comido, e foi aonde estava o cadáver.
Tomou-o e levou-o clandestinamente para a sua casa, a fim de sepultá-lo com cuidado depois do sol posto.
Tendo escondido o cadáver, começou a comer com pranto e tremor,
lembrando-se do oráculo que o Senhor tinha pronunciado pela boca do profeta Amós: Vossas festas mudar-se-ão em luto e lamentações (Am 8,10).
Quando o sol se pôs, ele foi e o sepultou.
Seus vizinhos criticavam-no unanimemente. Já uma vez ordenaram que te matassem, precisamente por isso, e mal escapaste dessa sentença de morte, recomeças a enterrar os cadáveres!
Mas Tobit temia mais a Deus que ao rei, e continuava a levar para a sua casa os corpos daqueles que eram assassinados, onde os escondia e os inumava durante a noite.
Ora, aconteceu que um dia, cansado desse trabalho, voltou para a sua casa e deitou-se junto à parede onde adormeceu.
Enquanto dormia, caiu-lhe de um ninho de andorinhas esterco quente nos olhos, e ele tornou-se cego.
Deus permitiu que lhe acontecesse essa prova, para que a sua paciência, como a do santo homem Jó, servisse de exemplo à posteridade.
Como havia sempre temido a Deus, desde a sua infância, e guardado seus mandamentos, ele não se afligiu (nem murmurou) contra Deus por ter sido atingido pela cegueira.
Mas perseverou firme no temor de Deus, e continuou a dar-lhe graças em todos os dias de sua vida.
Assim como o bem-aventurado Jó foi insultado por outros chefes, assim seus parentes e amigos escarneciam de seu comportamento:
Onde está, diziam eles, essa esperança por cujo amor deste esmolas e sepultaste os mortos?
Porém Tobit repreendia-os, dizendo: Não faleis assim;
somos filhos dos santos (patriarcas), e esperamos aquela vida que Deus há de dar aos que não perdem jamais a sua confiança nele.
Ora, Ana, sua mulher, ia todos os dias tecer, e trazia o que ela ganhava com o trabalho de suas mãos.
Foi assim que, tendo trazido para casa um cabrito que recebera (como gratificação),
seu marido ouviu-o balir e disse: Vê que ele não tenha sido roubado; restitui-o ao seu proprietário, porque não nos é permitido comer, e nem mesmo tocar, o que foi roubado.
Ao que lhe respondeu sua mulher com indignação: Tua esperança é manifestamente vã; agora tuas esmolas mostram bem o que valem! Com estas e outras palavras semelhantes ela censurava-o duramente.